Entenda o caso dos empresários condenados por crime cometido contra AFR
[datar]A ação penal movida pelo Ministério Público de Mato Grosso contra os empresários Márcio Rogério Pinheiro, Antônio Darcilio Rodrigues Perestrelo e Adauto Kiyota, por falsas acusações proferidas contra o Agente Fiscal de Rendas Antônio Carlos de Moura Campos, chegou ao fim no mês de fevereiro.
A magistrada determinou condenação dos réus pela prática do crime de calúnia, segundo confere artigo nº 339, do Código Penal. O veredito, publicado no Diário de Justiça de Mato Grosso, já havia sido decretado pela juíza Selma Arruda, da Sétima Vara Criminal de Cuiabá, em 10 de novembro do ano passado. A sentença, segundo o AFR, reforça que detratores do fisco podem, com apoio da justiça, ser alcançados pelos rigores da lei.
“Que fique, então, a lição para os colegas da ativa. Esse é um risco que pode, no limite, envolver o agente do Fisco que não aceita propinas e age no estrito cumprimento de seu dever legal. Trata-se, porém, de possibilidade extremamente rara, que acontece apenas na eventualidade de o Fisco ver-se diante de esquemas de fraude estruturada, montados por integrantes de organizações criminosas operantes na seara fiscal”, afirmou Moura Campos.
O processo impetrado pelo MP de Mato Grosso, por meio da Promotoria de Defesa do Patrimônio Público, em 2008, foi motivado pela abertura de ação penal privada contra o AFR, que se deslocou ao estado para arrecadar documento fiscal das empresas Santa Cruz Industrial Comercial Agrícola e Pecuária Ltda, Sperafico da Amazônia S/A e Encomind Agroindustrial S/A.
Mesmo sabendo da inocência do fiscal, os empresários o acusavam de abuso de autoridade, calúnia, injúria e difamação. “A denúncia contra mim não tinha o menor fundamento, não passando de uma peça repleta de alegações simplesmente ‘inventadas’ pelos denunciantes”, pontuou o AFR.
A tramitação do processo contou com o suporte jurídico da Afresp e o Sinafresp na resolução do caso. “Entramos com habeas corpus no Tribunal de Justiça do MT, que foi acolhido por unanimidade pelos desembargadores”, explicou o fiscal.
Entenda o caso
O caso teve início em meados de novembro de 2004, quando Moura Campos, na condição de Diretor Adjunto da Diretoria Executiva de Administração Tributária (Deat), participou de uma força-tarefa com o fisco mato-grossense para apurar possíveis fraudes fiscais em um caso que ficou conhecido como “Soja Papel”. Empresas do estado simulavam as etapas de processamento do grão, desde a compra de soja, beneficiamento, até as respectivas exportações. Segundo as investigações na época, o esquema acontecia só no papel.
“As visitas fiscais a empresas do MT tiveram respaldo em ordem expressa expedida pela chefia da fiscalização tributária e em autorização subscrita pela própria promotora de Justiça que atuava no prédio da Secretaria da Fazenda local, além de terem sido realizadas com a participação de fiscais mato-grossenses especialmente designados para a missão”, disse o AFR.
Todo o esquema fraudulento gerava um pacote de crédito frio de ICMS, cujo montante era superior a R$ 100 milhões de reais. Na época, grandes empresas varejistas se beneficiaram do esquema de exportação fictícia. Ao simular a compra do grão em outro estado brasileiro, para fins de exportação, era automaticamente concedido um crédito fiscal frio, que deduzia a porcentagem de impostos a pagar.
A ação motivou a ida do AFR ao estado mato-grossense para arrecadar os documentos fiscais das empresas de fachada envolvidas no caso, Santa Cruz Industrial Comercial Agrícola e Pecuária Ltda e a processadora de grãos de soja, Sperafico da Amazônia S/A, além da armazenadora de soja, Encomind Agroindustrial S/A. Na época, os três empresários, que na realidade não passavam de ‘testas-de-ferro’ do mentor do esquema fraudulento, Adauto Kiyota, – sócio de uma empresa de consultoria tributária – imputaram a Moura Campos, a prática dos crimes de abuso de autoridade, calúnia, injúria e difamação.
Não obstante a inocência do acusado, o próprio mentor do esquema abriu uma ação penal privada, em seu nome e em nome da empresa Santa Cruz Industrial, contra Moura Campos, pelos crimes de calúnia, injúria e difamação. A ação foi trancada em decisão proferida em abril de 2006, pela 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, que concedeu habeas corpus, reiterando a ausência de provas.
Anteriormente, já havia sido protocolada pelos empresários uma representação criminal junto ao Ministério Público de São Paulo contra o AFR, instaurada para apurar o crime de abuso de autoridade. Encaminhado posteriormente ao MP de Mato Grosso, o procedimento deu origem a um inquérito policial. Além disso, Moura Campos também respondia a um Procedimento Investigatório de posse da Corregedoria da Secretaria de Estado de Fazenda do Estado de São Paulo. Ambos os processos também foram arquivados por falta de provas.
Em trechos do processo, a juíza reitera que a falsa denúncia movimentou três instâncias, o poder Judiciário, Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo e a investigação policial, exigindo uma tramitação processual desnecessária para averiguação dos supostos crimes. Todas estas ações intentadas contra o AFR deram origem à ação penal no Ministério Público de Mato Grosso por denunciação caluniosa contra os três empresários.
“No meu caso, ela se mostrou sensível à profunda injustiça, representada pela denunciação caluniosa não apenas para o denunciado, mas para o próprio Estado, que teve sua máquina movimentada por indivíduos inescrupulosos apenas como forma de satisfazer seus ímpetos retaliatórios contra um agente público”, relatou.
Os autos do processo relatam que o objetivo maior dos empresários era prejudicar o processo investigativo do caso ‘Soja Papel’, e, se conseguissem contaminar o curso da arrecadação, poderiam ter a chance de obter a restituição dos documentos, e, portanto, inviabilizar a apuração fiscal. “O conjunto probatório amealhado nos autos confirma a real intenção dos acusados de imputarem crimes a Moura Campos, mesmo sabendo que não os praticou, configurando, assim, o elemento subjetivo do dolo que requer o artigo 339, caput, do Código Penal”, relata a juíza.
Trechos do processo também reforçam que as condutas criminosas dos empresários foram comprovadas por meio de depoimentos das testemunhas ouvidas pela Sefaz, pelo inquérito policial e em juízo, além de transcrição de conversa telefônica obtida entre a vítima e funcionário da empresa Sperafico da Amazônia S/A.
Penas
Os empresários Adauto Kiyota e Antônio Darcilio Rodrigues Perestrelo tiveram as penas fixadas em três anos, sete meses e seis dias de reclusão e 72 dias-multa. Em relação a Márcio Rogério Pinheiro, a pena foi reduzida para o mínimo legal, dois anos, quatro meses e 24 dias de reclusão e 48 dias-multa. Isto porque ele afirmou ser sócio minoritário da empresa Santa Cruz Industrial Comercial Agrícola e Pecuária Ltda e que não tinha envolvimento com nenhuma ação judicial intentada ao AFR, embora trechos do processo relatem sua participação em representação criminal.
Os três acusados devem cumprir as penas em regime aberto, obedecendo ao artigo 59 do Código Penal, que não permite adoção de um regime mais severo. Porém, terão de obedecer a duas medidas restritivas: prestarão serviços comunitários, durante uma hora por dia, totalizando sete horas por semana; além disso, deverão permanecer em suas residências, aos sábados e domingos, das 23 horas às 6 horas, durante todo o período da pena.